PEREGRINAÇÃO E ENCANTAMENTO PELOS LIVROS - UM DEPOIMENTO

 Valéria Rocha Aveiro do Carmo

Sábado, 11 de agosto de 2018, resolvi empreender a saborosa missão de ir a 25ª Bienal Internacional do Livro – São Paulo, que se encerrou neste domingo, após 10 dias de intensas atividades literárias. Muito além da venda de livros em seus infindáveis estandes das editoras, a feira, organizada no pavilhão do Anhembi, reuniu diversos autores renomados para sessões de autógrafos, lançamentos de obras, palestras e debates. Levei meus dois filhos, a Larissa de 16 anos, e o Daniel, 8 anos. Cheios de curiosidade e desejo, pegamos um trem, atravessamos 8 estações, baldeamos para o metrô e, em duas linhas seguimos por mais 12 estações! Faltava pegar um ônibus no Tietê que finalmente nos faria chegar lá, mas eram tantas pessoas que não conseguiríamos embarcar tão cedo, então optamos por um uber, só que o trânsito também era tão intenso, que decidimos acabar o caminho a pé. Chegando lá, o desafio ainda não havia terminado! Fizemos muitos zigue-zagues na fila, para atingir a bilheteria para pagar a meia entrada da Larissa! Até perdi as contas! Depois, outra saga para imprimir as credenciais de professor, que, pelo sagrado direito/dever de se nutrir de conhecimento, tem a entrada franca. Só para o Daniel estava fácil entrar... Era uma multidão de pessoas querendo acesso aos livros! Essa dificuldade imensa para ingressar me fez sonhar com um Brasil que lê, que gosta de sentir o cheiro do livro, o toque... Que até mesmo tem hábito de buscar ambientes culturais! Estávamos já muito cansados quando, lá pelas 18h conseguimos, finalmente, passar pela catraca! E valeu! Pena que eu havia acabado de perder o debate sobre literatura e política, conduzido pelo Luiz Ruffato no Salão das Ideias... Seguimos então perdidos em meio aos inúmeros atrativos para as crianças!

Estandes como da Panini tinham proposta de painel de fotos, eram muitos os mangás, gibis, revistas... O apelo aos olhos das crianças ia se multiplicando e eles sendo deliciosamente enredados! A proposta pode ter intenção mercantilista, mas o resultado tem mais vantagens! De repente, da fila para pagar um livro que o Daniel escolheu “A batalha da torre” do You Tuber Marco Tulio, pudemos ver o Ziraldo em frente a Melhoramentos! A Lari, que ainda não tinha se empolgado, saiu correndo e foi em busca de um “Nino, o menino de Saturno”, da série Os meninos dos Planetas. O preço um pouco salgado... Lá fui eu para a fila do caixa! Larissa, que correu para a do autógrafo, já não conseguiu mais a senha... Ainda bem que deu para tirar fotos!     

Seguimos nosso percurso, entrando e saindo dos estandes... Havia contação de histórias: “As mil e uma noites” na Tenda das mil fábulas, espaço destinado às crianças. E tinha muito mais! Eu, que fui em busca de livros teóricos para meus estudos do Doutorado, entrei em um estande muito bacana com um pool de editoras de várias universidades. Lá consegui uma raridade de Wolfgang Iser “O fictício e o imaginário” e uma entrevista com Jacques Derrida sobre “Essa estranha instituição chamada literatura”, minha eterna paixão. Contudo, a fome crescia (essa do estômago, mesmo)! E tivemos que despender mais de uma hora para comer hambúrgueres e tomar dois milk shakes, mesmo estando em quatro pessoas, necessária economia para comprar mais livros, nosso verdadeiro foco!

Já se fazia tarde! Eu e a Lari entramos no estande da Companhia das Letras, onde formigava de gente, passando por baixo dos elásticos de um tipo de cavalete que obstruía a entrada. Não me arrependi da transgressão! Foi lá que achei meu romance, o lançamento que eu procurava: “Com armas sonolentas” de Carola Saavedra e a Lari se encantou com “Os detetives selvagens”, literatura mexicana de primeira, um livro de 622 páginas que não comumente atrairia o olhar de uma adolescente... Também não resisti em levar uma Biografia do Stalin para meu marido e “Eles eram muito cavalos”, o premiado do Ruffato, para minha irmã aniversariante! Saindo de lá vitoriosas, reencontramos os meninos que nos esperavam. Ainda tivemos fôlego para, com a ajuda do mapa, encontrar a Martins Fontes e lá adquirir um Honoré de Balzac com o qual iria presentear meu pai, neste segundo domingo de agosto: “O pai Goriot”, total relação com o tema! A Lari, lembrando a referência feita a O rei Lear pelo personagem do livro “O fazedor de velhos”, de Rodrigo Lacerda (emprestado pela minha colega Thais, a família inteira leu! Recomendado!). Saindo do salão, ainda adquirimos dois Warpzones, com Biografias do Super Mário e do Sonic para o Daniel e dois mangás para a Lari. Por falar em cultura oriental, ainda conseguimos aprender a contar de 1 a 10 em chinês e escrever nossos nomes, nessa língua, em marcadores de páginas. Havia um estande lindo da cultura árabe, mas não chegamos a acessar... Ah! Só no dia seguinte encontrei a minha irmã, Luci, que também estava na Bienal e ganhei um lançamento do Bauman, que irá enriquecer a minha pesquisa: “A individualidade numa época de incertezas”. Obrigada!

Depois de tudo o que vimos e sentimos, todos os ambientes estavam sendo fechados e nós ainda tínhamos o caminho de volta a percorrer. Não importava! O retorno seria bem mais doce e inspirado, pois já nos sentíamos maiores como seres humanos por tudo aquilo que os livros nos podem trazer!  E olha que lindo! Um menino de 8 anos lendo à meia noite, em sua volta para casa, após a descoberta de que um ambiente letrado pode ser fascinante! A bienal ditou o slogan “Venha fazer esse download de conhecimento” em uma supostamente necessária alusão às tecnologias de nosso tempo, porém ficou provado: ainda que a sala de aula de 2030 possa ser altamente tecnológica, como nos propôs a Microsoft, em seu estande, ainda podemos encontrar muito encanto no olhar de uma criança que acessa as fisicamente simples páginas de um livro!

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